Se você está grávida e mal consegue comer por causa dos enjoos, talvez já tenha ouvido alguém dizer: “isso é normal, faz parte”. Mas quando o mal-estar ultrapassa os limites do suportável, passa a impedir que você se alimente, hidrata e viva o seu dia com o mínimo de bem-estar, não é mais só um enjoo.
Nesses casos, estamos falando da hiperêmese gravídica, uma condição que vai muito além do desconforto típico do começo da gestação.
“Toda grávida sente enjoo no início da gestação.” → Mito
É verdade que a grande maioria das gestantes sentem náuseas no primeiro trimestre (mas nem todas), especialmente nas primeiras horas da manhã. Essa condição está relacionada ao aumento dos hormônios da gravidez, principalmente o hCG. Na maioria dos casos, os sintomas são leves e passam após a 12ª a 16 ª semanas.
Porém, quando esses enjoos são persistentes, impedem a alimentação, causam perda de peso e desidratação, é sinal de que algo não está dentro do esperado. Aí entra a hiperêmese gravídica, que exige acompanhamento médico.
“Hiperêmese gravídica é só um enjoo mais forte.” → Mito
A hiperêmese não é apenas um enjoo mais chato. É uma condição médica, que envolve vômitos intensos e frequentes, desidratação, perda de peso e até necessidade de internação. Muitas mulheres com esse diagnóstico precisam de soro, medicamentos e acompanhamento especializado.
Não se trata apenas de “sentir-se mal”. A intensidade e a frequência dos sintomas atrapalham a rotina, o descanso e a saúde da gestante.
“Essa condição não traz riscos para o bebê.” → Mito
Embora muitas gestações com hiperêmese gravídica evoluam bem, existe, sim, o risco de complicações, especialmente quando a mulher não recebe acompanhamento adequado. Entre os possíveis impactos estão:
- Restrição do crescimento fetal;
- Redução do líquido amniótico;
- Prematuridade.
Com o tratamento certo e acompanhamento próximo, o bebê tende a se desenvolver bem, mesmo que a mãe enfrente esse desafio nos primeiros meses.
“Quem teve hiperêmese em uma gestação tem mais chance de ter de novo.” → Verdade
Infelizmente, sim. Mulheres que já passaram por essa condição em uma gestação anterior têm mais chance de apresentar o quadro novamente. Porém, sabendo disso, é possível começar o acompanhamento obstétrico mais cedo, com orientações específicas e estratégias preventivas.
“Esse quadro tem origem psicológica.” → Mito
Essa ideia ainda persiste e é injusta com quem passa por essa experiência. A hiperêmese gravídica tem origem multifatorial, com grande influência hormonal (especialmente do hCG), genética e até imunológica.
Fatores emocionais podem intensificar os sintomas, mas não são a causa principal. Culpar a mulher por estar doente só contribui para o sofrimento emocional.
“O sofrimento emocional é parte importante da hiperêmese.” → Verdade
Embora a origem não seja emocional, o impacto psicológico da hiperêmese pode ser enorme. Sentir-se mal todos os dias, sem conseguir comer ou dormir, muitas vezes sem acolhimento, pode levar a:
- Ansiedade e tristeza;
- Sensação de culpa ou fracasso;
- Isolamento social;
- Dificuldade de se conectar com a gestação.
É fundamental que essa mulher receba apoio emocional, escuta ativa e acolhimento durante todo o processo.
“O tratamento da hiperêmese sempre exige internação.” → Mito
Nem sempre. A internação só é necessária quando a mulher está muito desidratada, com perda de peso severa, vômitos constantes ou sem conseguir se alimentar por longos períodos.
Na maioria dos casos, é possível controlar os sintomas com:
- Medicamentos antieméticos específicos;
- Reposição de líquidos por via oral;
- Suplementação vitamínica (como vitamina B6 e tiamina);
- Cuidados com a alimentação.
O tratamento deve ser individualizado, de acordo com a gravidade de cada caso.
“Não há nada que a mulher possa fazer para melhorar.” → Mito
Embora seja uma condição séria, existem estratégias que ajudam a aliviar os sintomas no dia a dia. Com orientação médica, a mulher pode testar abordagens como:
- Comer pequenas porções ao longo do dia, não ficando grandes períodos em jejum;
- Evitar cheiros fortes ou alimentos gordurosos;
- Preferir alimentos secos, como bolacha de água e sal ou torradas;
- Usar gengibre com cautela (em forma de chá ou bala);
- Evitar ficar com o estômago vazio;
- Manter líquidos por perto e tomá-los em pequenos goles.
Além disso, ter apoio emocional e prático (em casa e no trabalho) pode fazer toda a diferença na recuperação.
“A ultrassonografia pode ajudar no acompanhamento da hiperêmese.” → Verdade
Sim. O ultrassom pode ser um grande aliado. Ele ajuda a:
- Confirmar o tempo gestacional com precisão;
- Verificar se há gestação múltipla ou molar, que podem estar associadas a hiperêmese;
- Avaliar o desenvolvimento do bebê;
- Monitorar o volume de líquido amniótico.
É um exame importante para entender se a condição da mãe está afetando ou não o bebê.
“A mulher não consegue se vincular ao bebê por estar mal.” → Mito (e um julgamento injusto)
Estar passando por um período difícil fisicamente não significa que a mulher não está conectada com o bebê. Ela pode estar sofrendo, sentindo medo ou culpa, mas isso não diminui a relação que está se formando.
O vínculo não é definido pela ausência de sintomas. O amor pode nascer e crescer mesmo nos momentos mais difíceis. E cuidar da mãe é também cuidar da relação com o bebê.
“Com acolhimento e acompanhamento adequado, é possível viver melhor esse momento.” → Verdade
Mesmo que a gestação comece de forma difícil, ela pode se tornar mais leve com o cuidado certo. Contar com uma equipe que acolha, respeite e entenda o que a mulher está passando pode mudar completamente a experiência.
Buscar ajuda médica ao notar que os enjoos estão fora do comum é um passo importante de cuidado com o corpo, com as emoções e com o bebê.
Mensagem final da Dra. Samantha Pessôa.
“A hiperêmese gravídica é real, intensa e transformadora. Não é frescura, não é exagero.
Se você está passando por isso, saiba que não está sozinha. Existe tratamento, acolhimento e caminhos para que essa fase seja vivida com mais dignidade e respeito.
Você merece ser ouvida, cuidada e respeitada — em todas as fases da sua gestação.”
Técnica Responsável:
Dra. Samantha Ramos Toledo Pessôa – CRM-SP: 104245
Ginecologista Obstétrica e Medicina Fetal
Título em Ginecologia e Obstetrícia pela FEBRASGO
Certificado de Atuação em Medicina Fetal pela FEBRASGO
Fontes:
- ACOG – American College of Obstetricians and Gynecologists
Nausea and Vomiting of Pregnancy, Practice Bulletin No. 189
🔗 https://www.acog.org/clinical/clinical-guidance/practice-bulletin/articles/2018/01/nausea-and-vomiting-of-pregnancy - RCOG – Royal College of Obstetricians and Gynaecologists
Green-top Guideline No. 69
🔗 https://www.rcog.org.uk/guidance/browse-all-guidance/green-top-guidelines/nausea-and-vomiting-of-pregnancy-and-hyperemesis-gravidarum-green-top-guideline-no-69/ - Mayo Clinic – Hyperemesis gravidarum
🔗 https://www.mayoclinic.org/diseases-conditions/hyperemesis-gravidarum - FEBRASGO – Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia
🔗 https://www.febrasgo.org.br
Imagem: Canva


