Entrevista com a Dra. Samantha Pessôa
Durante os exames de rotina na gestação, é comum que alguns termos técnicos apareçam no laudo do ultrassom e gerem dúvidas ou até medo. Um exemplo é quando o relatório indica uma alteração no cordão umbilical, como artéria umbilical única, inserção velamentosa ou até a presença de um nó verdadeiro.
Mas será que esses achados representam, de fato, um grande risco? Ou é possível encarar a gestação com mais tranquilidade, mesmo diante dessas variantes?
Para responder a essas e outras perguntas, conversamos com a Dra. Samantha Ramos Toledo Pessôa, ginecologista obstetra com atuação em medicina fetal. Ela traz objetivas para que as futuras mães possam entender melhor essas situações e se sentir mais confiantes.
Por que tantas mulheres se assustam quando o laudo do ultrassom traz uma observação sobre o cordão umbilical?
Dra. Samantha: Porque, na maioria das vezes, essas pacientes não sabem o que esses termos significam. Como o cordão umbilical é o responsável pela nutrição fetal, tanto do ponto de vista nutricional quanto de oxigênio, qualquer alteração nele tanto estrutural quanto posicional, causa grande ansiedade. Portanto é importante entender que variações nem sempre representam perigo real para a gestação.
Vamos começar com o “artéria umbilical única”. O que ele significa na prática?
Dra. Samantha: O cordão normal tem três vasos: duas artérias e uma veia. Quando há apenas uma artéria e uma veia, chamamos de artéria umbilical única. Isso pode ser apenas uma variante anatômica sem repercussões, principalmente se os exames do bebê estiverem normais. Em alguns casos, porém, pode estar associado a malformações ou alterações cromossômicas, e por isso exige um acompanhamento mais atento.
O que tranquiliza muitas pacientes é saber que, com o pré-natal bem feito e acompanhamento por ultrassons especializados, a maioria dos bebês com “artéria umbilical única” nasce saudável.
E a chamada “inserção velamentosa”? Por que esse nome tão diferente?
Dra. Samantha: A inserção velamentosa acontece quando o cordão se insere nas membranas da placenta, e não diretamente em seu centro. Isso faz com que os vasos do cordão fiquem mais expostos e vulneráveis, especialmente no momento do parto. Por isso, essa condição merece atenção especial, mas não pânico.
O diagnóstico é feito por ultrassom com doppler, e, quando bem monitorado, é possível evitar complicações. Às vezes, é indicado antecipar o parto ou optar por cesariana, dependendo da localização dos vasos.
Existem outras variantes que merecem ser acompanhadas?
Dra. Samantha: Sim. Há outras situações que podemos detectar por ultrassonografia:
- Inserção marginal, quando o cordão se conecta na borda da placenta;
- Nó verdadeiro, que é o cordão literalmente enrolado como um laço;
- Cordão enrolado no pescoço, também chamado de circulares de cordão.
Essas situações podem parecer preocupantes, mas, na maioria dos casos, o bebê segue crescendo bem. O importante é ter um profissional capacitado analisando fluxo sanguíneo, crescimento fetal e liquido amniótico, entre outros parâmetros.
Quando essas variações podem realmente exigir um cuidado maior?
Dra. Samantha: Se houver alterações no crescimento do bebê, alterações nos batimentos cardíacos ou fluxos doppler alterados, a equipe médica pode indicar um monitoramento mais frequente. Isso significa mais ultrassons, às vezes semanalmente, além de avaliação do bem-estar fetal.
Em alguns casos, também indicamos o perfil biofísico fetal, que é um tipo de “check-up” do bebê dentro do útero. A meta é acompanhar de perto e agir com segurança quando necessário.
Então, é possível viver uma gestação saudável mesmo com essas alterações no cordão?
Dra. Samantha: Sim, é totalmente possível. A maior parte das variantes do cordão não impede que o bebê se desenvolva normalmente, desde que a gestante faça o pré-natal direitinho. E mesmo quando há algum risco aumentado, a medicina fetal permite um acompanhamento muito preciso.
É natural que a mulher se assuste com termos médicos, mas é fundamental que ela tenha um canal aberto com sua equipe de saúde. Perguntar, entender, participar do processo de decisão… tudo isso ajuda a tornar a experiência da gestação mais segura e humana.
O que você costuma dizer para acalmar uma gestante que recebe um diagnóstico desses?
Dra. Samantha: Eu sempre digo: “A informação certa na hora certa diminui o medo e aumenta o controle da situação.” Explico cada termo com calma, uso comparações do dia a dia, e reforço que, com acompanhamento, temos muitos caminhos para garantir o bem-estar do bebê e da mãe.
O mais importante é que a mulher se sinta acolhida e bem informada, sem alarmismo, mas com seriedade. Isso muda tudo.
Para quem acabou de receber um laudo com uma dessas variações do cordão, o que você recomenda como próximos passos?
Dra. Samantha:
- Evite buscar explicações na internet sem fonte segura — isso costuma aumentar o medo.
- Leve o laudo para a próxima consulta e peça uma explicação detalhada.
- Pergunte se será necessário algum exame extra ou acompanhamento diferente.
- Mantenha uma rotina de autocuidado: boa alimentação, descanso e atenção aos sinais do corpo.
Acima de tudo, confie na sua equipe médica e não tenha vergonha de fazer perguntas. Informação e vínculo com o profissional fazem parte do cuidado.
Para finalizar, qual mensagem você gostaria de deixar para quem está passando por isso agora?
Dra. Samantha: Nem toda alteração significa que algo está errado. Muitas vezes, estamos apenas diante de uma variação natural do desenvolvimento da gravidez. A ciência está do nosso lado, e com atenção e carinho, podemos conduzir essas gestações com segurança e amor.
Então, se você recebeu um diagnóstico de cordão umbilical diferente do habitual, respire. Informe-se, acompanhe e siga com confiança. Seu bebê está sendo bem cuidado.
Fontes:
- FEBRASGO – Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia
https://www.febrasgo.org.br - The American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG)
https://www.acog.org - Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG)
https://www.rcog.org.uk - PubMed – Artigos sobre cord anomalies
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov - Hospital Israelita Albert Einstein – Medicina Fetal
https://www.einstein.br
Imagem: Canva